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O filme do último Conselho de Ministros em plenitude de funções
Porto, cidade granítica, na sua majestosa pose não soalheira. Dia chuvoso e cinzento. Talvez este fosse um resumo dos últimos meses do Governo de António Costa, marcado por inconvenientes ventosos e baldes de água fria. Aqui e ali se tentaram abrir os guarda-chuvas para que a tempestade não fosse tão custosa, mas, depois de tantas ameaças, uma rajada final pôs término aos oito anos de Costismo.
O relógio ainda não marca as 9:15 quando Duarte Cordeiro e Marina Gonçalves sobem a escadaria principal dos Paços do Concelho, onde está situada a Câmara Municipal do Porto. O longo tapete vermelho que cobre a entrada e os degraus do edifício começa a humedecer. A chuva intensa não dá espaço para apertos de mão nem abraços no exterior, mas nem lá dentro são amassados.
Em passo apressado, como quem escapa da chuva, fugiram também de proferir algumas palavras sobre o último ato formal do Governo antes da entrada em gestão. Aos ministros do Ambiente e da Habitação junta-se, cinco minutos depois, o secretário de Estado Adjunto do primeiro-ministro, António Mendonça Mendes.
O anfitrião, Rui Moreira, não está à entrada da sede do Município para receber o elenco que representa o Estado central que esta quinta-feira, 7 de dezembro, marcou presença, ao contrário do que aconteceu no dia anterior, no mesmo lugar onde se deu a assinatura de dois documentos "de extrema importância" para a delegação de poderes, naquela que é para António Costa "a cidade da descentralização".
O alvoroço nos corredores é audível, tanto para quem lá trabalha habitualmente como para os seguranças e jornalistas que aguardam a chegada, a conta-gotas, das "estrelas" do dia. Aos seguranças resta esperar e receber os ministros; aos jornalistas cabe preparar cadernos e canetas, microfones e câmaras para registar o momento.
O ministro da Administração Interna, e agora candidato à liderança do PS, José Luís Carneiro, atravessa as portas dos Paços do Concelho poucos minutos antes do seu colega da Economia, António Costa Silva.
O primeiro com sorriso no rosto e com direito a cumprimentos a membros do Governo; o segundo sem uma palavra ou olhar em volta, subindo a escadaria em silêncio, que é interrompido pela ministra da justiça: "Bom dia a todas e a todos." Catarina Sarmento e Castro, Elvira Fortunato, Ana Mendes Godinho e João Costa sobem ao terceiro andar. O ministro da Educação entra logo a seguir.
Manuel Pizarro e Mariana Vieira da Silva entram segundos depois. De blusa e casaco vermelho, cor do partido da qual é membro, e ministra da Presidência desde março do ano passado, apressa-se a subir de andar mas sem antes, de forma calma, cumprimentar os presentes.
Finalmente, os Paços do Concelho abrem portas uma última vez a António Costa como primeiro-ministro antes da entrada em gestão. Um mês depois de apresentar a demissão que mergulhou o país numa inesperada crise política, o chefe do Governo entra em passo veloz no edifício sem grandes palavras. A expressão, um sorriso nervoso, de quem sabe que é a última vez que surge ainda na pele de primeiro-ministro em plenitude de funções.
Ministro da Cultura fala dos tempos difíceis dos jornalistas aos grevistas
Na sala ecoavam as vozes de jornalistas, entre perguntas e diretos que iam fazendo, do lado direito da entrada. Os microfones esticam-se: "Estou muito constipado, com dificuldade em falar mas com muita vontade de continuar a trabalhar até ao último dia."
Estas poderiam ser palavras de António Costa. A frase é do ministro da Cultura, que minutos antes recebia em mãos o manifesto do Sindicato dos Jornalistas que estão, neste mesmo dia, em greve. O Jornal de Notícias - o jornal "mais próximo das pessoas desta cidade", nas palavras do ministro -, estava parado há mais de 24 horas, num protesto contra a ameaça de um forte despedimento coletivo. O sindicalista Augusto Correia recorre a Pedro Adão e Silva para se fazer ouvir dentro do edifício.
O tom de voz do ministro é baixo, como se de um segredo se tratasse. O (quase) silêncio contrastava com a vontade dos jornalistas que estavam do lado de fora da Câmara. Eis o governante a falar aos jornalistas sobre os tempos difíceis que os próprios vivem e conhecem melhor do que ninguém. Correia olha para o chão enquanto o ministro responde a perguntas do outro lado da baia. A esperança é de que o assunto seja tratado na reunião que se seguia.
Poucos minutos depois de subir ao terceiro andar, Adão e Silva vem acompanhado de todos aqueles que até agora chegaram ao edifício. A escadaria é invadida pelos 17 ministros, alguns secretários de estado, António Costa e Rui Moreira. José Luís Carneiro, que assumia a posição dianteira, deixa depois o seu, quem sabe, futuro antecessor tomar o lugar da frente, num pequeno gesto no dia do último ato formal de António Costa como primeiro-ministro.
Sorrisos para a fotografia "de família habitual". Costa e Moreira na frente, num último lado a lado entre autarca e primeiro-ministro. As conversas prolongam-se durante e depois dos cliques das câmaras fotográficas. O último Conselho de Ministros formal do Governo de Costa ia começar.
Nos corredores do edifício, as opiniões são semelhantes entre trabalhadores. "Não existe grande oposição à altura deste governo. Apesar de todos os casos, polémicas e interferências durante os últimos meses, o PS ainda se consegue manter e não ter quem o vá derrubar", confessa, em segredo, uma técnica superior da Câmara do Porto, que preferiu não ser identificada. A favor da descentralização em vigor, disse ainda esperar que o próximo Governo continue com este projeto e que o traga para o Porto mais vezes, mas ainda mais para outras cidades do país.
"Apesar de tudo, temos de reconhecer que em política orçamental houve um ótimo desempenho deste Governo, que se vai traduzir a nível internacional e na qualidade de vida dos portugueses", defende um técnico jurista da autarquia. Quando questionado sobre a importância da agenda no Porto, disse não querer "folclore". "Não vivemos disto, mas é sempre bom reconhecer que há uma preocupação em caminhar a passos grandes para uma maior descentralização."
Ao meio-dia há já quem diga que só volta na segunda-feira
As câmaras estão prontas desde as 10 horas da manhã. Na sala onde Mariana Vieira da Silva e Frederico Francisco (secretário de Estado Adjunto das Infraestruturas) iriam mais tarde prestar declarações estava cheia - os meios de comunicação social espalhavam-se pelas 26 cadeiras disponíveis na sala, de frente para o palco azul e três púlpitos. As paredes altas são cobertas com tapeçarias que escondem a pedra do edifício. "(Os retratos) podiam ser da última ceia", ironiza um dos jornalistas.
Passavam quase trinta minutos das 10 quando Mendonça Mendes sai para fumar. Junta-se aos jornalistas na varanda da sala ao lado onde decorria a reunião. Repetiu o processo uma, duas, três vezes.
Pouco tempo depois entra na sala de reuniões uma equipa com caixas brancas e cestos (pressupõe-se) de comida. Já passava do meio-dia e mais de duas horas de decisões, sinal de demora. "Tudo aponta para que acabe às 13:30", anuncia a responsável de comunicação da autarquia.
Percorre-se os corredores da Câmara e há já quem diga que só volta na segunda-feira. Ao contrário dos colegas, preferem não comentar o fim do Governo ou o local do último Conselho de Ministros de Costa.
"Não estamos autorizados a falar", confessam. O silêncio estende-se à sala onde se aguarda por Mariana Vieira da Silva e Frederico Francisco por mais uns minutos. Estará subentendido a demora da reunião? Mais de três horas e meia. "O costume, normalmente demoram mais", ouve-se na sala.
Não demorou a ser anunciado de que tinha terminado, ao mesmo tempo que, de lá de fora, ouve-se a palavra de ordem "Redação vazia, não há democracia". Às 2 da tarde entoava na sala de espera apitos, buzinas e vozes em protesto: os jornalistas em greve estavam de volta, sem chuva e sem medo, por entre casacos, cachecóis e cartazes.
Já não conseguiram apanhar o primeiro-ministro, que tinha saído apressadamente do edifício cinco minutos antes. Saiu como entrou: calado. Todos os ministros mimetizaram o chefe. Entram separadamente nos carros designados para o Executivo e despedem-se do centro da cidade.
14:47: Depois do compasso de espera de quase uma hora, as duas pessoas mais esperadas do dia saem pela porta da direita que já era supervisionada desde as 10 horas e sobem ao pequeno palco azul.
Após uma longa confusão de barulhos, faz-se silêncio. Os gestos repetidos de Mariana Vieira da Silva espelhavam um nervosismo visível – passou as mãos pelo cabelo mais de meia centena de vezes. Outras tantas na cara. A inquietação de quem parece deixar trabalho por fazer, ou gostava de ter mais tempo para o executar. Entre goles de água bebidos e movimentos de "põe e tira" óculos, mexe e remexe folhas, a ministra anuncia os temas aprovados nas últimas horas. Em tom rápido.
"Porto, dezembro de 2023" – o prazo que Vieira da Silva confronta atrás de si, no palco, enquanto Frederico Francisco explica alguns dos 35 documentos aprovados. O microfone vai passando entre jornalistas para as questões habituais e a ministra esboça um sorriso para alguns deles. Caras conhecidas que já a acompanham há muito. Este não será o seu último Conselho de Ministros, diz, de forma aparentemente assertiva. "Até às próximas eleições estarei disponível para dar a cara nestas decisões", afirma.
Cerca de 40 minutos depois retornam ao salão Dona Maria, palco da última reunião de um Governo de maioria absoluta que entrou em gestão esta sexta-feira, 8 de dezembro.
*Texto editado por Rui Neves