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29 agosto 2022 09h40

PS e PSD apontam baterias à inflação na rentrée

PS e PSD apontam baterias à inflação na rentrée
Agravamento do custo de vida é prioridade para os maiores partidos na reabertura do Parlamento. PS aposta em medidas contra a inflação no OE2023 e PSD quer programa de emergência. Bancos centrais reafirmam compromisso de combater subidas de preços, mesmo que com dor, antecipando novas subidas de juro

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REGRESSO A SAO BENTO O QUE QUEREM OS PARTIDOS PARA O NOVO ANO POLÍTICO

Bianca MarQueS. Filipa Maua^Peí 'ira

Depois das férias, todos os partidos dão prioridade às medidas para combater os efeitos da inflação. O reinicio dos trabalhos parlamentares, previsto para 6 de Setembro, vai ser marcado pelo Orçamento do Estado, mas também por temas polémicos, como a eutanásia, a Lei dos Metadados ou o regresso dos debates quinzenais com o primeiro-ministro

Depois das férias de Verão, os partidos estãojá a preparar o novo ano político e há uma preocupação em comum da esquerda à direita: a inflação. Será um dos assuntos que vai dominar a agenda política, mas ficaram por resolver outros dossiers, como a eutanásia, a Lei dos Metadados ou a revisão do Regimento da Assembleia da República. As polémicas com o Chega, nomeadamente o conflito entre André Ventura e Augusto Santos Silva, também vão marcar o retomar dos trabalhos parlamentares, previsto para dia 6 de Setembro.

As prioridades do PS para o novo ano político são "o combate à inflação e a preparação do Orçamento do Estado para 2023”, diz ao NOVO Eurico Brilhante Dias. "Fechar os metadados, a despenalização da morte medicamente assistida e a discussão do Regimento da Assembleia da República são também questões essenciais”, acrescenta o líder parlamentar do PS.

A agenda para o ano legislativo será lançada nas jornadas parlamentares, entre 11 e 13 de Setembro, em Leiria, com a promessa de que durante esta sessão legislativa serão promovidas várias iniciativas para combater a violência doméstica.

O PSD já anunciou que vai apresentar um programa de emergência nacional na reabertura dos trabalhos parlamentares. Luís Montenegro antecipou-se ao Governo, que tenciona aprovar um novo pacote de medidas para apoiar as famílias e empresas em Setembro, e lançou desde já cinco medidas para "minorar o impacto da crise inflacionista”.

Atribuir um vale alimentar de 40 euros por mês, de Setembro a Dezembro, às famílias com maiores dificuldades, reduzir o IRS nos terceiro, quarto e quinto escalões, e dar mais dez euros por mês a todas as crianças e jovens que recebem abono de família, a partir de agora e até ao final do ano, são os eixos principais desse programa de emergência Criar linhas de apoio às instituições particulares de solidariedade social e às pequenas e médias empresas mais afectadas pelo aumento dos custos da energia é outra das solu-ções avançadas pelos sociais-democratas.

O PSD quer também dar prioridade à revisão do Regimento da Assembleia da República. O regresso dos debates quinzenais com o primeiro-ministro é o ponto mais polémico, com os socialistas a resistirem ao modelo que vigorou até Julho de 2020. O PS propõe que o primeiro-ministro vá ao Parlamento uma vez por mês, mas passaria a existir um debate quinzenal com um dos ministros.

PSD, Chega. Iniciativa Liberal, Bloco de Esquerda, PAN e Livre querem o primeiro-ministro no Parlamento de 15 em 15 dias. Tenho esperança de que seja possível chegar a uma solução”, diz ao NOVO Duarte Pacheco, deputado do PSD. A primeira reunião do grupo de trabalho está prevista justamente para 6 de Setembro.

A eutanásia é outro dos temas quentes que transitou para depois das férias de Verão. Os projectos do PS, PAN, Bloco e IL foram aprovados em Junho e o objectivo é chegar a um texto comum que possa contornar as dúvidas levantadas pelo Presidente da República. Na prática. Marcelo Rebelo de Sousa pediu uma clarificação dos critérios para a despenalização da morte medicamente assistida. O Presidente da República mantém os poderes de enviar novamente o diploma para o Tribunal Constitucional, vetar ou promulgar.

Não menos polémica é a Lei dos Metadados. A missão dos deputados é responder às objeções colocadas pelo Tribunal Constitucional, que declarou inconstitucionais as normas que determinam a conservação dos dados de tráfego e localização das comunicações, pelo período de um ano, para eventual utilização numa investigação criminal.

O grupo de trabalho que está a trabalhar na nova lei decidiu prolongar a discussão para ouvir várias entidades, entre as quais a Provedora de Justiça, o director da Polícia Judiciária e o presidente da ANACOM (Autoridade Nacional das Comunicações).

Os conflitos com o Chega

A reabertura dos trabalhos parlamentares voltará a avaliar as polémicas que envolvem o partido liderado por André Ventura. Ainda durante o mês de Setembro, a comissão de Assuntes Constitucionais, a pedido de Augusto Santos Silva, deverá

ps.parlamento.pt tomar uma posição sobre a proposta do Chega para "censurar o comportamento do presidente da Assembleia da República por não pautar a sua conduta institucional com a imparcialidade e a isenção exigíveis ao exercício do cargo”.

Na opinião do antigo vice-presidente do Parlamento e ex-líder parlamentar do PSD, Guilherme Silva, dificilmente existem condições para que o Chega consiga atingir os seus objectivos. "Há outras formas de exercer a crítica. Não me parece que esta seja a mais adequada”, diz.

André Ventura também já anunciou a intenção de insistir na eleição do vice-presidente da Assembleia da República. O novo nome será anunciado em breve, depois de terem sido chumbados Diogo Pacheco de Amorim e Gabriel Mithá Ribeiro. A posição dos partidos não deverá, porém, alterar-se e é quase certo que o candidato indicado pelo Chega voltará a ser rejeitado.

AO NOVO, fonte do partido define ainda como prioridade a apresentação do projecto de revisão constitucional com algumas das principais bandeiras do Chega, como a introdução da prisão perpétua ou a diminuição do número de deputados.

A Iniciativa Liberal encontra um ponto comum entre as várias prioridades para o novo ano político: "Estarão todas alinhadas com a necessidade urgente de contrariar a crescente mediocridade a que o PS quer condenar o país”, diz ao NOVO fonte oficial do grupo parlamentar.

Os liberais vão "insistir em colocar no centro da agenda política o problema da falta de crescimento económico”. Só assim será possível "criar oportunidades de crescimento profissional e pessoal para as novas gerações e evitar que sejam obrigadas a emigrar gerar recursos para fezer face à acelerada degradação dos serviços públicos” e "tomar Portugal um destino atractivo para quem cá deseje viver ou investir”, acrescenta a mesma fonte.

As jornadas parlamentares da Iniciativa Liberal estão previstas entre 19 e 20 de Setembro e terão como tema central a educação. Desagravar e simplificar os impostos, desburocratizar a relação das famílias e empresas com o Estado e introduzir uma cultura de mérito da Administração Pública são outros dos temas a que os liberais querem dar prioridade na sessão legislativa que termina em Setembro de 2023.

Esquerda quer aumentos

À esquerda, a prioridade é apresentar medidas para enfrentar a inflação devido à guerra na Ucrânia. O grupo parlamentar do PCP "pautará a sua intervenção pela proposta e a concretização de medidas, que consideramos urgentes e prioritárias, que respondam aos problemas decorrentes da degradação das condições de vida dos trabalhadores e do povo, designadamente as que correspondam ao aumento de salários e pensões exigíveis face à inflação e à perda de poder de compra, ao controlo de preços, quer dos produtos energéticos, alimentares quer de outros”, diz ao NOVO fonte do PCP, que aponta ainda para "o reforço dos serviços públicos, em particular do Serviço Nacional de Saúde e da escola pública”.

O Livre também quer "ver avanços claros e palpáveis na recuperação de rendimentos”. Rui Tavares considera, em declarações ao NOVO, que "estamos a viver várias crises ao mesmo tempo” e são necessárias medidas que permitam "às pessoas poupar nos seus custos”. Uma das propostas que o deputado do Livre tenciona apresentar vai no sentido de aumentar 0 "investimento no transporte público, seja urbano, seja rural, seja a nível nacional, de forma a poder baixar os custos na mobilidade dos portugueses”.

O Bloco de Esquerda também tem sido crítico sobre a forma como o Governo está a enfrentar esta crise, mas reservou para mais tarde a definição das prioridades para o novo ano político.

Já o PAN quer dar prioridade ao plano para "deseucaliptar” Portugal depois de um Verão marcado pelos incêndios em várias regiões do país. A protecção dos animais vai continuar a ser uma das principais bandeiras do partido de Inês Sousa Real, que quer "garantir que não há retrocessos legislativos na protecção dos animais de companhia, alargar a protecção aos outros animais sensíveis e proceder à regulamentação do plano nacional para desacorrentar animais de companhia”. Entre a lista de prioridades está também "garantir a aprovação de regulamentação dos estágios remunerados" e aprovar medidas para aumentar a eficiência dos transportes públicos.

Certo é que o combate aos incêndios vai marcar o reinicio dos trabalhos parlamentares. O Chega anunciou que vai agendar um debate sobre o que falhou. PSD e Iniciativa Liberal querem também esclarecimentos sobre as afirmações feitas pela secretária de Estado da Protecção Civil em relação à área ardida. Patrícia Gaspar afirmou que os "algoritmos e dados dizem que a área ardida” em Portugal deveria "ser 30% superior”.

Eurico Brilhante Dias

Líder parlamentar do PS

cc Estamos a viver várias crises ao mesmo tempo”

Rui Tavares

Deputado único do Livre

"Está na hora de travar a especulação e controlar os preços. Está na hora de repor o poder de compra perdido

pelos salários e pelas reformas”

Jerónimo de Sousa

Secretário-geral do PC

Bancada parlamentar do PS promete dar prioridade ao combate à

inflação

Bancos centrais vão insistir no combate à inflação

Ricardo Santos Ferrelra geral@novo.lapanews.pt

JUROS

Presidente da Reserva Federal raefirmou compromisso com contenção da subida de preços e avisou para "alguma dor” para a economia americana. Europa poderá estar em pior situação.

Apersistência da inflação é o actual inimigo declarado dos bancos centrais e isso ficou claro no Jackson Hole Economic Symposium, a reunião anual organizada no estado norte-americano do Wyoming pela Reserva Federal de Kansas City e que funciona como uma rentrée dos bancos centrais, no final do Verão. Os receios com o crescimento económico e com as consequências das medidas decididas para escalar a subida dos preços ficam, por agora, em segundo plano, porque o objectivo é limitar a inflação.

No seu discurso em Jackson Hole, Jerome Powell, presidente da Reserva Federal dos Estados Unidos da América (EUA), sublinhou a necessidade de conter a inflação, reafirmou um compromisso com este objectivoo que se traduz na continuação do processo de encarecimento do dinheiro, através da subida das taxas de juro - e avisou, mesmo, para "alguma dor” que disto resultará para a economia norte-americana.

Este discurso, o mais esperado, é um sinal da continuação do ciclo de subida das taxas de juro e teve reflexos imediatos nos mercados accionistas, que reagiram em baixa, dos dois lados do Atlântico.

"O combate à inflação, à sua dinâmica nefasta e aos vícios que a auto-alimenta, é a principal função de um banco central. Para um banco central é mais importante reestabelecer a estabilidade de preços do que evitar uma recessão”, diz ao NOVO Paulo Rosa, economista sénior do Banco Carregosa. "Esta insistência dos bancos centrais será cada vez mais visível, nem que imponha uma recessão mais ou menos cavada”, acrescenta.

No ano passado, no mesmo evento - ainda que tivesse decorrido Online, por causa da pandemia de Covid-19 Jerome Powell defendeu que o aumento dos preços seria um fenómeno temporário, resultante, essencialmente, de problemas relacionados com as cadeias de abastecimento e com a dificuldade de responder ao aumento da procura, mas, depois da guerra desencadeada pela invasão russa da Ucrânia, a percepção é diferente e os EUA enfrentam o maior surto inflacionista em quatro décadas.

Para o economista sénior da Reserva Federal de St. Louis, no Missouri, nos Estados Unidos, Miguel Faria e Castro, a génese da inflação é diferente nos EUA e na Europa, o que poderá levar a nuances na actuação dos bancos centrais. "Na Europa temos, essencialmente, uma contracção da oferta agregada, o que leva a uma recessão e leva ao aumento do nível de preços; nos EUA temos contracção agregada e grande expansão da procura agregada, o que leva a uma expansão do produto e ao aumento do nível de preços”, explicou, em entrevista publicada pelo Jornal Económico.

A inflação homóloga nos Estados Unidos desacelerou 0,6 décimas, em Julho, para 85%, em consequência da queda dos preços da energia, especialmente da gasolina, que tombou 7,7%. A inflação subjacente, que exclui os preços dos alimentos e da energia, mais voláteis, acelerou 0,3 décimas, para 5,9%.

Ao NOVO, David Brito, director-geral da Ebury Portugal, diz que estes dados podem indicar um ponto de inflexão. "Começamos a ver sinais de estabilização nas pressões de preços, há assim uma sensação geral de que a inflação pode já ter atingido o pico”, diz.

Europa ainda a acelerar

Na Europa, a situação é diferente: a taxa de inflação homóloga na zona euro acelerou em 03 pontos percentuais, em Julho, para 8,9%, mantendo a tendência verificada desde Junho de 2021 puxada, principalmente, pelo aumento dos preços da energia.

"Ao contrario dos EUA, as taxas de inflação [europeias] ainda não mostraram sinais de desaceleração e o pior ainda poderá estar por vir, devido ao forte aumento dos preços da energia na Europa, principalmente do gás natural”, aponta David Brito.

Miguel Faria e Castro considera que, na Europa, ‘a questão é um pouco mais complicada, porque grande parte da inflação advém da contracção da oferta e não tanto da expansão da procura”. Acrescenta que "também é claro que o BCE enfrenta um trade-off mais chato, por assim dizer, do que a Reserva Federal: pode subir as taxas de juro para moderar a inflação, mas isso vai piorar a situação do desemprego e de crescimento; ou pode não fazer nada, e isso, em princípio, não piora a situação no desemprego e crescimento, mas a inflação pode tornar-se descontrolada”.

"A estabilidade de preços continua a dominar as preocupações e políticas dos bancos centrais, ainda mais numa altura em que a inflação é bastante elevada e existe pleno emprego nos EUA e a taxa de desemprego na Europa tem melhorado, pelo que afasta qualquer preocupação com o crescimento económico por parte dos bancos centrais e centra-os, exclusivamente, no combate à inflação, nem que para isso a economia entre em recessão”, conclui Paulo Rosa.

"Para um banco central é mais importante reestabelecer a estabilidade de

preços do que evitar uma recessão”, diz Paulo Rosa