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23 junho 2023 09h15

A recessão e a correlação inversa entre as taxas de poupança e de inflação

A recessão e a correlação inversa entre as taxas de poupança e de inflação
PAULO ROSA Economista Sénior do Banco Carregosa

Os últimos dados da inflação norteamericana em maio mostraram que os consumidores sofreram o 26º mês consecutivo de crescimento negativo dos salários reais, ou seja, a inflação tem superado sucessivamente os ganhos salariais, sendo uma notícia desfavorável para as finanças das famílias, tendo muitas recorrido à utilização do cartão de crédito. Entretanto, a taxa de poupança pessoal tem recuperado ligeiramente desde junho do ano passado (aquando do máximo da inflação) à medida que a taxa de inflação abranda.

Existe uma correlação negativa quase perfeita entre a taxa de poupança e a taxa de inflação, tendo a poupança caído significativamente desde o início de 2021 conforme a inflação se ia gradualmente instalando na economia dos EUA, diminuindo paulatinamente o rendimento disponível das famílias. A alta das taxas de juro que se seguiu, ditada pela postura decididamente restritiva dos bancos centrais na tentativa de travarem a subida dos preços, tem aos pouco ameaçado o crescimento económico e o emprego, deteriorando ainda mais os rendimentos das famílias, indiciando cada vez mais uma recessão, constatada pela inversão da curva de rendimentos do tesouro norte-americano. A taxa de poupança está nos 4%, níveis inferiores à média de 7% verificada entre 2010 e início de 2020, tendo neste período superado a inflação em cerca de 5 pontos percentuais. Os preços muito mais elevados, sobretudo das rendas de casa ("shelter”) e da alimentação, devido à inflação mais alta dos últimos 40 anos, força os consumidores a utilizarem todos os seus fundos de emergência, a maior parte amealhados durante o confinamento ditado pela pandemia (círculo C1 no gráfico da poupança vs inflação), tendo sido a maioria sob a forma de cheques governamentais. O regresso da taxa de inflação ao objetivo de 2% da Reserva Federal dos EUA poderia indiciar uma economia mais frágil e eventual recessão, corroborada também pela habitual subida da taxa de poupança em momentos de incerteza, para os níveis de 7%. Isso poderá acontecer em 2024 num contexto recessivo?

Crédito ao consumo nos níveis mais elevados dos últimos 30 anos associado ao pagamentos dos juros mais altos em várias décadas, esgotam as poupanças das famílias, sinalizando uma desaceleração nos gastos do consumidor e eventual recessão num futuro não muito longínquo.