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31 março 2023 16h55
Fonte: Exame

Maior cautela na remuneração aos acionistas

Maior cautela na remuneração aos acionistas
Apesar dos lucros históricos, as empresas vão diminuir os dividendos que irão pagar aos seus investidores

Os lucros das cotadas podem ter vários destinos. As empresas têm a possibilidade de usar uma proporção dos resultados para remunerar os acionistas, avançar com novos investimentos, reduzir dívida ou reforçar o valor que têm em liquidez, de forma a terem uma rede de segurança mais forte para fazerem face a imprevistos. No ano passado, pagaram dividendos recorde, referentes ainda ao exercício de 2021, exercício em que os resultados recuperaram fortemente do impacto sofrido com a crise pandémica. Em 2022, os lucros subiram ainda mais, atingindo valores históricos. Mas, tendo em conta as 11 propostas para a remuneração aos acionistas já conhecidas, os gestores das cotadas nacionais aparentam estar cautelosos. Além da incerteza económica, também o facto de alguns resultados terem sido impulsionados por operações não recorrentes pode ajudar a explicar esta maior moderação.

O valor a distribuir pelos acionistas, por parte daquelas empresas, deverá cair de €2 544 milhões para €2 329 milhões, segundo cálculos da EXAME. O rácio payout – peso da remuneração aos acionistas no bolo total dos resultados – deverá cair para o valor mais baixo da última década. Do lucro obtido no ano passado, 53% irá para aos bolsos dos acionistas. A média dos últimos anos no PSI era de um rácio de pagamento na ordem de 73%. As contas não incluem o scrip dividend da EDP Renováveis, nem as recompras de ações próprias por parte da Galp e dos CTT. Em vez de um dividendo em dinheiro, aquela empresa do Grupo EDP propõe um programa de remuneração flexível para os acionistas, que passa pela entrega de direitos sobre novas ações da cotada que poderá implicar um montante máximo de instrumentos avaliados em 275 milhões. No entanto, mesmo contabilizando este valor no bolo total dos dividendos, o rácio payout seria de 59%, bem abaixo da média dos últimos anos.

"O elevado grau de incerteza da economia e dos mercados financeiros internacionais e o atual grau de previsibilidade da política de dividendos das empresas do PSI deverá limitar os dividendos por ação a um retorno que poderá ser próximo aos juros do BCE e, no máximo, não deverá ultrapassar a inflação ‘core’”, salienta João Queiroz, head of trading do Banco Carregosa. Ainda assim, é possível encontrar algumas cotadas na bolsa nacional com taxas de rendimento dos dividendos elevadas (ver página 20).

OS MAIORES DIVIDENDOS

Apesar de os lucros históricos não serem correspondidos por uma política mais expansiva nos dividendos, continuam a existir empresas que destinam uma parte importante do seu lucro aos acionistas. Algumas propõem mesmo remunerações acima dos resultados obtidos no ano anterior. É o caso da EDP. A elétrica deverá distribuir quase €800 milhões, apesar de o lucro não ter ido além de €679 milhões. A empresa liderada por Stilwell de Andrade paga o maior dividendo em dinheiro da bolsa nacional. Já a NOS e a REN reservam mais de 90% do resultado líquido para premiar os acionistas, num montante de €221 milhões e €103 milhões, respetivamente. Porém, estas duas cotadas não entram no pódio dos maiores dividendos da bolsa nacional. Além da EDP, o top 3 é composto pela Galp – com €431 milhões – e pela Jerónimo Martins, que conta premiar os acionistas com €345 milhões.

Já a nível global, as estimativas da Janus Henderson apontam para um abrandamento no crescimento do valor pago em dividendos ao longo de 2023. Esta gestora de ativos prevê um aumento de 2,3% para 1,6 biliões de dólares nas 1 200 maiores cotadas do mundo. Isto depois de as remunerações pagas em 2022 terem crescido 8,4%, atingido um máximo histórico de 1,56 biliões de dólares. E

Milhões

Valor total do dividendo proposto pela EDP

Milhões

Montante total dos dividendos indicados pela Jerónimo Martins

800 345 431

Milhões

Remuneração proposta pela Galp aos acionistas, relativa a 2022

EDP

A elétrica liderada por Stilwell de Andrade vai pagar o maior dividendo do PSI. A empresa conta distribuir €799,9 milhões pelos seus acionistas

QUEM RECEBE OS MAIORES CHEQUES?

Há investidores que vão receber mais de €100 milhões de cotadas do PSI

> FAMÍLIA SOARES DOS SANTOS

A participação de 56,14% da Sociedade Francisco Manuel dos Santos – controlada pela família Soares dos Santos – na Jerónimo Martins dará direito a um dividendo de cerca de €194 milhões.

> CHINA

O Estado chinês detém 20,86% da EDP – através da China Three Gorges – e 25,5% da REN, por intermédio da State Grid. A participação na elétrica dará direito a um dividendo de quase €167 milhões, enquanto o investimento na empresa que gere as infraestruturas energéticas nacionais irá render quase €26 milhões. No total, Pequim deverá encaixar €193 milhões com as participações em empresas do PSI.

> FAMÍLIA AMORIM

A posição de 55% na Amorim Energia, entidade que detém 33,92% da Galp, permitirá à família Amorim obter um dividendo de quase €81 milhões da petrolífera

> BLACKROCK

Caso mantenha a participação na EDP, após o recente aumento de capital da elétrica, a maior gestora de ativos do mundo terá direito a um dividendo de €75 milhões da elétrica. Mas o encaixe total na bolsa portuguesa poderá ser maior, já que a BlackRock tem investimentos em mais cotadas. No entanto, como em muitos casos não ultrapassam os limites a partir dos quais têm de ser divulgados, não é possível estimar o valor total.

> SONANGOL

A petrolífera estatal angolana detém 45% da Amorim Energia, o que dá direito a cerca de €65 milhões em dividendos da Galp. Poderá ainda receber remuneração pela sua posição no BCP, que admite pagar um valor "tímido”.

> FAMÍLIA QUEIROZ PEREIRA

A participação de 83,22% da família Queiroz Pereira na Semapa dar-lhe-á direito a um dividendo de €65 milhões. Esta empresa, por sua vez, irá receber quase €140 milhões, devido à posição de 69,97% que detém na Navigator.