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29 setembro 2023 10h35

PIB e inflação, curvas de Phillips e de rendimentos

PIB e inflação, curvas de Phillips e de rendimentos

A evolução do rendimento do tesouro norte-americano a 2 anos tende a ser um fiável preditor dos movimentos das taxas de juro da Reserva Federal dos EUA, sendo talvez esta maturidade a que melhor reflete as perspetivas para a taxa de inflação num ambiente de preços no consumidor elevados, corroborando a sua notável capacidade preditiva quanto à evolução do índice de preços no consumidor e das Fed Funds Rate. Já o rendimento do tesouro norte-americano a 10 anos, apesar também da sua relativa importância na antecipação da evolução das taxas de juro e da taxa de inflação, tende a refletir mais a evolução da economia (o crescimento económico).


Ou seja, taxa de inflação e economia nem sempre andam de mãos dadas, dependendo muito da fase do ciclo económico. E o desempenho das duas principais classes de ativos, obrigações e ações, depende também dos níveis de inflação e do PIB (economia).


No 1º quadrante (Q1), caracterizado por crescimento económico num contexto de preços no consumidor relativamente mais altos, a inflação e o PIB estão correlacionados positivamente. No 2º quadrante (Q2), de inflação elevada e economia estagnada ou em recessão, confirmando um cenário de estagflação, a inflação e o PIB estão correlacionados negativamente. No 3º quadrante (Q3), identificado por baixa inflação ou deflação num cenário de recessão económica, os preços (inflação) e PIB voltam a estar correlacionados positivamente. No 4º e último quadrante (Q4), dado por baixa inflação ou deflação de preços no consumidor num quadro de expansão económica, inflação e PIB regressam à correlação negativa.


No Outlook trimestral do passado dia 20 de setembro, a Fed confirmou a atual robustez do mercado de trabalho dos EUA comprovado pelo relatório do emprego de agosto, diminuindo as perspetivas para a taxa de desemprego e aumentando as expectativas para o crescimento económico. Entretanto, reduziu a inflação esperada para o final do ano. Ou seja, a Fed vê agora menos inflação e mais crescimento económico em 2023, relativamente à anterior projeção de junho. Desde essa altura, a yield do tesouro a 10 anos aumentou 20 pontos base de 4,30% para 4,50%, refletindo uma melhoria da economia, enquanto a yield do tesouro a 2 anos subiu apenas 5 pontos base de 5,05% para 5,10%, comprovando uma ligeira descida das perspetivas para a inflação. Desde a divulgação do Outlook da Fed e discurso de Jerome Powell às 19h00 de Lisboa do dia 20 de setembro até ao fecho no dia 26 de setembro, o preço da obrigação do tesouro dos EUA a 10 anos (ISIN US91282CHT18) desceu de 96,5% para 94,78%, uma desvalorização de quase 2%, enquanto a obrigação soberana norte-americana a 2 anos (ISIN US91282CFK27) manteve-se quase inalterada, tendo descido apenas de 97,15% para 97,03%. Estas obrigações pagam uma taxa de cupão muito semelhante, de 3,50% a 2 anos e 3,875% a 10 anos. A obrigação a 10 anos tem mais duration, logo é mais sensível às taxas de juro.


A curva de rendimentos norte-americana está invertida há mais de um ano, mas o declive negativo entre os 10 anos e os 2 anos tem diminuído desde o início de julho (de 110 pontos para 60 pontos), tendo acelerado desde a semana passada, mostrando uma menor inclinação da curva, confirmando as melhores perspetivas da Fed para a economia e as expectativas do banco central dos EUA para um abrandamento da taxa de inflação.


Uma curva de rendimentos invertida antecipa recessão económica a prazo. Mas, no entanto, a curva de Phillips apresenta a sua habitual correlação positiva entre a economia (emprego, PIB, produto) e a taxa de inflação, ou seja, a curva de Phillips representa o trade-off entre a taxa de inflação e a taxa de desemprego. Assim, uma baixa taxa de desemprego, atualmente de 3,8% nos EUA, quase pleno emprego, corrobora uma economia relativamente robusta, num ambiente de taxa de inflação ainda elevada, testemunhando um atual 1º quadrante. Se a economia desacelerar significativamente, como preconizado pela inclinação negativa da curva de rendimentos, entrando em recessão (taxa de desemprego mais elevada e uma taxa de inflação mais baixa, corroborando a clássica curva de Phillips), o Q3 seria uma realidade, quadrante favorável às obrigações soberanas, mas desfavorável aos mercados acionistas. Entretanto, se uma eventual recessão económica for acompanhada por uma taxa de inflação ainda relativamente elevada, por exemplo impulsionada pelo aumento da cotação do barril do petróleo nos próximos trimestres, o 2º quadrante, caracterizado pela estagflação, seria o enquadramento económico mais provável, não confirmando a curva de Phillips. Em suma, a curva de Phillips é apenas confirmada no Q1 e Q3, não sendo validada no Q2 e Q4.