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10 fevereiro 2025 17h40
Fonte: ECO

Preços do gás em níveis de há dois anos. E podem subir mais

Preços do gás em níveis de há dois anos. E podem subir mais

Um inverno rigoroso e reservas mais baixas do que no ano anterior estão a pressionar os preços da matéria-prima.


Os preços do gás natural têm estado em trajetória ascendente e esta segunda-feira estavam a tocar máximos de abril de 2023. Os níveis de armazenamento e o inverno rigoroso são as razões mais indicadas entre os analistas consultados pelo ECO/Capital Verde. Apesar de os preços ainda estarem longe dos vistos na última crise energética, já são suficientes para causar transtorno junto de empresas e consumidores, e há margem para que continuem a subir.


Os preços do Title Transfer Facility , o contrato de gás natural negociado nos Países Baixos e que é referência para a Europa, atingiu, esta segunda-feira, os 58,75 euros por megawatt-hora (euros/MWh), ao nível de fevereiro de 2023, confirma o Banco Carregosa, com base nos dados da Bloomberg. De acordo com a plataforma ICE, estes mesmos contratos fecharam nos 58,34 euros/MWh, ainda em linha com níveis de fevereiro de há dois anos.


De acordo com a Agência Internacional de Energia (AIE) , curvas de futuros de meados de janeiro sugeriam que os preços do TTF subiriam 30% em 2025 , em comparação com os níveis de 2024.


" A tendência ascendente a que temos assistido nos preços do gás TTF reflete, em larga medida, preocupações sobre os níveis de reservas de gás europeias, à medida que o inverno avança ", escreve a Aleasoft, apontando que o armazenamento europeu está agora em cerca de 50%, que compara com os 68% do mesmo período do ano anterior.


O economista sénior do Banco Carregosa, Paulo Rosa, afirma que estes níveis caíram devido a "um inverno mais rigoroso que o previsto”, no qual "a procura por aquecimento aumentou, em particular no norte e oeste da Europa.


Além disto, parte do setor industrial recuperou da crise de 2022 e 2023 e retomou níveis mais altos de produção, continua a Aleasoft, aumentando a utilização de gás. "Se as reservas caírem demasiado, isso significa que a Europa vai precisar de comprar mais gás no verão para preencher as reservas e estar preparada para o próximo inverno” o que "exerce uma pressão para o aumento dos preços”, explica a casa de análise.


Henrique Valente, da ActivTrades, acrescenta duas variáveis à equação: a produção interna de gás na Europa tem vindo a diminuir e, no início de janeiro, houve a interrupção do fornecimento de gás russo através da Ucrânia.


"As perspetivas para este ano indicam que os preços do gás podem continuar elevados”, aponta Henrique Valente. " Com base nas tendências históricas e na atual trajetória ascendente, espera-se que os preços possam continuar a subir nos próximos meses ", embora uma melhoria na capacidade de armazenamento e uma economia europeia mais fraca possam "atenuar aumentos significativos”, reforça Paulo Monteiro Rosa.


O mesmo analista afirma que, se as restrições de oferta persistirem, o preço do TTF pode atingir os 60-65 euros por megawatt-hora (eur/MWh). Já um inverno mais ameno, uma desaceleração económica mais acentuada e um fornecimento reforçado de LNG podem estabilizar os preços entre os 45 e os 55 euros/MWh.


A Aleasoft assinala uma "situação atípica”: os futuros do gás para o verão estão a cotar a níveis mais altos do que os contratos para o inverno, quando geralmente o inverno apresenta maior pressão dada a maior procura para fins de aquecimento. " Esta curva pouco usual indica que os traders esperam competição forte por LNG nos próximos meses ", à medida que a Europa restabelece as reservas, "colocando uma pressão adicional em alta nos preços”, afere a mesma fonte.


Mas o que será decisivo para a evolução dos preços este ano? "Muito vai depender das condições meteorológicas no resto do inverno”, indica a Aleasoft. Ao mesmo tempo, "a grande questão é quão agressivamente a Europa vai precisar de preencher as suas reservas” – se estas estiverem baixas em abril, deverá assistir-se a um "disparar” na procura no verão, "o que deverá manter os preços acima dos níveis típicos sazonais”.


" Se o reabastecimento for insuficiente na primavera e no verão, os preços podem manter-se elevados ", alerta Paulo Rosa. O economista sénior do Banco Carregosa assinala ainda que do lado geopolítico, as disputas comerciais em curso, nomeadamente a tarifa imposta pela China sobre o LNG dos Estados Unidos, podem perturbar as cadeias de abastecimento e aumentar a volatilidade.


Competitividade e consumidores afetados


Os preços caíram mais de 90% desde os seus máximos históricos e desde março de 2023, sublinha Henrique Tomé, analista da XTB, relativizando os níveis atuais, face aos da crise energética. " Apesar de os preços estarem a negociar a níveis crescentes, não estamos a aproximarmo-nos dos níveis recorde que se verificaram nesse período ", complementa a Aleasoft. Mas isso não significa que não existam impactos.


" O aumento dos preços do gás tem um impacto significativo na economia europeia ", afirma o analista da ActivTrades, apontando como consequências dos preços uma inflação mais persistente e um impacto negativo na competitividade das indústrias intensivas em energia, como a química e metalúrgica.


Por um lado, estas empresas podem querer realocar-se, com impacto económico associado, ou também podem repassar os custos elevados para os consumidores, resultando em preços mais altos para bens e serviços.


Em adição, os preços da eletricidade tendem a seguir os preços do gás, na medida em que, nas horas em que é necessário recorrer a este recurso para responder às necessidades de consumo, é o gás que define o preço de toda a eletricidade vendida naquela hora. " A subida dos preços da energia reduz o rendimento disponível das famílias, afetando o poder de compra e enfraquecendo o consumo geral ", alerta Paulo Rosa.


Ana Batalha Oliveira