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Concentração de risco nos EUA impulsionada pela ‘lei gravitacional de Newton’

Impulsionado pelo crescente protagonismo das gigantes tecnológicas do S&P 500, o investimento cada vez mais concentrado nas bolsas americanas aumenta gradualmente a exposição ao risco dos EUA. Avaliado em 51 biliões de dólares, o índice, atualmente próximo dos 6100 pontos, representa 1,8 vezes o PIB nominal dos EUA e metade do PIB global - algo sem precedentes. Este fenómeno reflete a tendência global dos investidores, alocando cada vez mais capital em ativos americanos. Sustentado pela robustez e pelo potencial de retorno associado à inteligência artificial (IA), o S&P 500 funciona como um pólo gravitacional, atraindo riqueza de todo o mundo. Contudo, esta força não é ilimitada. Se o mercado americano enfraquecer, a sua capacidade de atração diminuirá, com impactos significativos na economia global. Além disso, a força gravitacional, tanto na física como na economia, é bidirecional, ou seja, enquanto o "resto do mundo”, sobretudo através de excedentes comerciais, exerce força sobre os EUA, as bolsas americanas atraem grande parte do investimento global.
A magnitude dessa força depende das "massas” envolvidas - como PIB, comércio internacional ou montantes investidos em bolsa - e da distância entre os locais, medida cada vez mais em tempo e menos em quilómetros. De acordo com a fórmula (F=G*[(M1*M2)/D^2)]), a força gravitacional (F) é proporcional ao produto das massas de dois lugares (M1 e M2), mas inversamente proporcional ao quadrado da distância (D), onde G é a constante gravitacional universal. Quanto maior a "massa”, maior a atração, mas quanto maior a distância, menor a influência. Por isso, economias remotas, como as dos povos isolados da Amazónia ou da Papua Nova Guiné, quase não são influenciadas pela economia americana.
Como maior economia global e sede de gigantes tecnológicas como Apple, Microsoft e Nvidia, os EUA possuem uma "massa” económica significativa, atraindo capital global à procura de segurança, retornos elevados e maior exposição à inovação. Simultaneamente, as empresas americanas investem no exterior, refletindo uma força bidirecional visível na produção em países como a China. Esta interação entre os EUA e o "resto do mundo” — incluindo economias avançadas como a europeia e japonesa ou emergentes como a chinesa e indiana — cria uma interdependência económica. Por exemplo, a China exporta para os EUA, acumula dólares e reinvesteos frequentemente em ativos americanos, como obrigações do tesouro e ações, valorizando esses ativos. Ao mesmo tempo, as multinacionais americanas dependem dos consumidores globais para sustentarem o crescimento.
No modelo gravitacional, a distância influencia a atração económica, que é medida em tempo e não em quilômetros. Os avanços tecnológicos reduziram significativamente esta distância, fortalecendo a conectividade global. Quanto menor a distância em tempo, maior a atração económica. No entanto, se um dos lados — EUA ou o resto do mundo — perder massa económica devido a uma recessão, a força de atração diminuiu proporcionalmente. Por exemplo, um abrandamento nos lucros das empresas americanas pode redirecionar fluxos de capital para outros mercados, alterando o equilíbrio gravitacional.
Apesar do otimismo em torno da IA e de empresas como a Nvidia estarem a impulsionar a valorização dos mercados americanos, há riscos no horizonte. Os Indicadores Económicos Avançados (Leading Economic Indicators, LEI) apontam para uma recessão há 30 meses, enquanto a regra de Sahm está em 0,43 pontos percentuais (pp), próximo dos 0,50 pp que indiciam recessão. Além disso, a Fed de Nova Iorque estima uma probabilidade de 33% de recessão nos próximos 12 meses. Outro ponto crítico é a atual concentração excessiva em poucas empresas tecnológicas que dominam o S&P 500. Embora tenham gerado retornos elevados, a concentração aumenta a vulnerabilidade do mercado, evocando paralelos históricos como o desmembramento do império de Rockefeller pelas regulamentações antitruste. Hoje, gigantes como Apple e Microsoft enfrentam desafios semelhantes.
Ainda assim, o mercado americano continua a atrair investidores, impulsionado pelas expectativas de ganhos de produtividade proporcionados pela IA e por um crescimento económico sustentado de 3%. A valorização do mercado acionista fomenta um ciclo de otimismo e estímulo ao consumo nos EUA, enquanto a política orçamental expansionista reforça igualmente o crescimento. Todavia, esta dinâmica pode reverter. Se os lucros não corresponderem às expectativas, o S&P 500 perderá massa e força gravitacional. A concentração de risco em poucas empresas e num único mercado é um alerta para potenciais crises globais. A implosão de uma eventual bolha tecnológica, impulsionada pela IA, pode desencadear efeitos de cascata, impactando investidores em todo o mundo.
Paulo Monteiro Rosa, Economista Sénior do Banco Carregosa